A afinidade
A afinidade não é o
mais brilhante, mas o mais sutil, delicado e penetrante dos sentimentos.
É o mais
independente.
Não importa o tempo,
a ausência, os adiamentos, as distâncias, as impossibilidades.
Quando há
afinidade,
qualquer reencontro
retoma a relação, o diálogo, a conversa, o afeto no exato ponto em que foi
interrompido.
Afinidade é não haver
tempo mediando a vida.
É uma vitória do
adivinhado sobre o real.
Do subjetivo para o
objetivo.
Do permanente sobre o
passageiro.
Do básico sobre o
superficial.
Ter afinidade é
muito raro.
Mas quando existe,
não precisa de códigos verbais para se manifestar.
Existia antes do
conhecimento, irradia durante e permanece depois que as pessoas deixaram de
estar juntas.
O que você tem
dificuldade de expressar a um não afim, sai simples e claro diante de alguém
com quem você tem afinidade.
Afinidade é ficar longe pensando parecido a respeito dos
mesmos fatos que impressionam, comovem ou mobilizam.
É ficar conversando sem trocar palavras.
É receber o
que vem do outro com aceitação anterior ao entendimento.
Afinidade é sentir
com, nem sentir contra, nem sentir para, nem
sentir por, nem sentir pelo.
Quanta gente ama
loucamente, mas sente contra o ser amado.
Quantos amam e
sentem para o ser amado, não para eles
próprios.
Sentir com é
não ter necessidade de explicar o que está sentindo.
É olhar e perceber.
É mais calar do
que falar, ou, quando é falar, jamais explicar: apenas afirmar.
Afinidade é jamais sentir por.
Quem sente por, confunde afinidade com masoquismo.
Mas quem sente com,
avalia sem se contaminar.
Compreende sem
ocupar o lugar do outro.
Aceita para
poder questionar.
Quem não tem
afinidade, questiona por não aceitar.
Afinidade é ter perdas semelhantes e iguais esperanças.
É conversar no
silêncio, tanto nas possibilidades exercidas quanto das impossibilidades
vividas.
Afinidade é retomar a
relação no ponto em que parou sem lamentar o tempo de separação.
Porque tempo e
separação nunca existiram.
Foram apenas
oportunidades dadas (tiradas) pela vida, para que a maturação comum pudesse se
dar.
E para que cada
pessoa pudesse e possa ser, cada vez mais a expressão do outro sob a forma
ampliada do eu individual aprimorado.
é um dos poucos
sentimentos que resistem ao tempo e ao depois.
Arthur da Távola
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